sexta-feira, 27 de maio de 2011

Pólos ás riscas

Há coisas que nunca mudam. Há pra aí uns 20 anos atrás, era eu um imberbe estagiário na minha actividade laboral, quis o destino que viesse ter ás minhas mãos um documento de trabalho que trazia agregado, por esquecimento ou lamentável lapso, uma mensagem íntima e pessoal de carácter estritamente particular. Para explicar em linguagem mais moderna, imaginem que recebem um mail que não é dirigido a vocês, um mail onde o remetente se enganou ao clicar no destinatário.
Dependendo do teor da mensagem, podemos ou não alertar o remetente. Epá olha que te enganaste, este mail para o teu banco a dizer que não podes pagar a prestação da casa este mês, veio parar a mim por engano. Envia lá isso para o mail correcto e já agora vê lá se me pagas os 50 euros que te emprestei na semana passada. Um abraço deste teu grande amigo que a partir de agora nunca te vai esquecer.
Mas, depende. Há mensagens que, atento o seu teor, que pode ser deveras constrangedor, um gajo não tem coragem de avisar o remetente acerca do lamentável lapso. Não há ninguém que não escreva uma vez por outra mensagens constrangedoras que revelam as realidades constrangedoras que toda a gente tem. Mas só são mensagens constrangedoras quando estão nas mãos erradas. Mensagens como aquela, de há pra ai uns 20 anos atrás.
No papel manuscrito, uma colega minha dirigia-se ao seu amante! Imagine-se os olhos arregalados de um estagiário desbarbado perante o acesso involuntário a tão confidencial missiva. Dizia-se numa letra de forma inconfundivelmente feminina (a letra das gajas, vá-se lá saber porquê, é sempre, mas sempre mais arredondada que a nossa), que se ansiava pelo próximo encontro, que já não se suportava mais o marido, que se queria voltar a sentir assim prazer como nunca antes se tinha sentido... Não sei quem seria o destinatário da missiva, nunca soube. Não sendo eu, não tinha a mínima curiosidade em saber. Neste aspecto, o da cusquice, acho que é uma das minhas (poucas) virtudes. Mas sabia quem era o insuportável marido, um também colega, um tipo com duas características que já então achava profundamente irritantes: tinha sempre um sorriso estúpido na cara (e então passei a distinguir o sorriso alienado dum cornudo) e usava sempre, e quando digo sempre, digo no Inverno também, pólos ás riscas. Ás riscas, não se confunda com risquinhas. Há uma diferença no efeito cromático que convém esclarecer. Se for ás risquinhas, a certa distância parece ser um polo liso. Tolerável portanto, se o individuo se mantiver a uma distancia de nós superior a 50 metros. Agora, ás riscas, o individuo vem a 500 metros e já sentimos uma institiva repulsa que se entranhará mesmo que ele se mantenha a essa distancia de segurança.
Ou seja, as características do tipo, daquele insuportável marido e intragável colega, segundo o meu ponto de vista, justificariam qualquer traição. Um gajo que se vestia assim, com um sorrido daqueles, não me lixem, só merecia ser encornado! E só lamentava que a traidora se dirigisse ao destinatário amante, no singular. Parece que mais regozijo sentiria, mais justiça se faria, se o destinatário fosse alguém no plural, não apenas um qualquer colega desesperado a tal ponto de ser capaz de comer aquela gaja, mas antes um grupo de dois ou três pretos que dupla e triplamente a penetrariam por todo o lado, dando-lhe o tal prazer como nunca antes sentira, que dupla e triplamente encornariam o das riscas.
Eu mudei, deixei de ser um imberbe funcionário público. Eles não mudaram nada. Trabalham no mesmo sítio onde eu fui estagiário. Passados 20 anos, encontro o casal feliz. Ela com aquelas mesmas pernas pequeninas, sempre sem meias, com os músculos gémeos demasiado salientes, mesmo para quem gosta de gajas com pernas de futebolista. Aquele tipo de gaja cuja estrutura anatómica honestamente reflete com grande rigor uma personalidade desinteressante e não menos insuportável que o marido. Ele com as eternas riscas, acompanhados de alguém mais novo, com pinta de estudante universitário que, presumo, deva ser filho, mas que não usa pólos. Deve sair ao pai.