sábado, 29 de outubro de 2011

Cinzento

Vou agora escrever uma coisa que se fosse no Facebook seria considerada uma estupidez sem comentário, um exibicionismo barato e uma vaidosice parva. Assim, aqui, é só uma estupidez sem comentário: o meu carro, sob o cinzento do céu de Outono, fica ainda mais bonito. Fica o carro mais bonito do mundo.
A ligação que um gajo tem com o seu carro é uma coisa que as gajas nunca irão entender.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Então hoje vamos dormir aqui ?

Mas aqui onde...no Sheraton ? Não, no trabalho. E quem profere tão sugestiva ideia...ao menos uma gaja boa ? Não, a colega que sofre de espandilose. A tipa ao menos estava com meias de ligas pretas vestidas ? Não, usa sempre calças. Mas a que propósito veio tão enigmática sugestão...acaso vinha imbuída de uma complexa mensagem subliminar ou acompanhada de um qualquer tique lânguido que pudesse evidenciar um qualquer desejo indomável de cometer um acto que configurasse um momento singular e que decerto ficaria marcado de forma indelével na memória de quem o praticou ? Não, a tipa disse-o só para não estar calada quando se cruzou comigo no corredor que dá acesso aos WC's.
São coisas assim que geralmente acontecem quando fico a trabalhar até ás tantas.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

A minha casa vazia

Pela primeira tenho um carro com comando das portas à distância. O fascínio é tanto que hoje de manhã, quando saí para a rua, devo ter carregado instintivamente no botão do comando para fechar a porta de casa. Quando voltei, ao final do dia, estava aberta. Entrei e verifiquei que estava tudo bem. Continuava vazia.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Acabo de ouvir na rádio o tipo que dá sempre voz à publicidade da Honda, a marca de carros que sempre conduzi, a dar a voz a um anúncio sobre disfunção eréctil. É esquisito.  É assim como não acreditar em fantasmas mas ver a porta do roupeiro do quarto abrir-se sozinha.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Sempre que vou atrasado para o trabalho Deus Nosso Senhor castiga-me. Hoje no comboio à minha frente ia uma gaja que já conheço de vista de outras viagens do costume, o tipo de gaja de quarentas e tais onde já se notam os sinais das desesperantes tentativas que matinalmente faz antes de sair de casa para se parecer ainda uma gaja nova. Durante toda a viagem foi a tagarelar com outra gaja que ia ao lado, enquanto passava com a mão pelo cabelo e depois observava os dedos a um palmo da cara para verificar se traziam agarrado algum cabelo perdido. E traziam quase sempre. Por breves instantes fitava-os ficando com uma expressão vesga nos olhos, como que observando com detalhe quantos cabelos tinha arrancado, a cor, o número de série, etc. Depois, ensaiava com os dedos uma breve tentativa de fazer com os cabelos uma bola, que no fundo era mais como que um ritual de despedida, e deixava-os cair para o chão, que é como quem diz, para cima dos meus sapatos, porque eram os meus sapatos que estavam no espaço exíguo de chão que nos separava.
A imagem de montes de cabelos da gaja repousados caóticamente sobre os meus pés agoniou-me a viagem toda. Para ajudar à festa, ao meu lado ia um velho que quase ao mesmo ritmo com que a gaja arrancava cabelos do escalpe, escarrava para um lencinho branco que se ia tornando cada vez mais verde e que desdobrava e depois dobrava metódicamente para voltar a guardar e depois voltar a buscar ao bolso.
Quando senti o imenso alívio que foi sair daquele comboio, no caminho a pé para o trabalho, à minha frente ia uma gaja daquelas que ao andar junta os joelhos e caminha com a ponta dos pés à frente virados um para o outro. Deus Nosso Senhor tinha ainda de me fazer lembrar que nunca comi uma gaja assim. E bem que Ele sabe que não gostaria de morrer sem o fazer!